Venceu o voto do relator, Nunes Marques, pela manutenção de lei gaúcha que prevê uma fiscalização mais rígida para o “devedor contumaz” de ICMS
A norma e seu decreto regulamentador alteram o prazo de pagamento do ICMS e exigem do devedor contumaz, por exemplo, a apresentação periódica de informações financeiras.
A ação analisada pelos ministros foi proposta pelo antigo Partido Social Liberal (PSL). A legenda alegou violação às garantias constitucionais da liberdade de trabalho e de comércio. Também argumentou que já existem outras vias de execução fiscal.
A sigla ainda disse que somente uma lei complementar poderia instituir um regime especial de fiscalização, pois o tema está relacionado à proteção do crédito tributário.
Fundamentação
Prevaleceu o voto do ministro Kassio Nunes Marques, relator do caso. Ele foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Flávio Dino, Dias Toffoli, Edson Fachin, Gilmar Mendes, Luiz Fux, André Mendonça e Luís Roberto Barroso.
Segundo Nunes Marques, a lei do Rio Grande do Sul não trata de normas gerais tributárias. Na verdade, ela busca apenas induzir comportamentos positivos do contribuinte.
“Da simples leitura dos dispositivos legais impugnados é possível concluir que não são direcionados à normatização de aspectos essenciais do tributo”, apontou.
Assim, na sua visão, não seria necessária uma lei complementar para abordar o assunto: “A fiscalização, atividade administrativa, de natureza técnica, voltada à verificação do cumprimento das obrigações tributárias e à arrecadação, de acordo com as especificidades locais, não é matéria reservada à lei complementar.”
Além disso, de acordo com ele, a fiscalização ou a cobrança do crédito tributário “não se confundem com seus atributos, sua constituição ou exigibilidade”, e a proteção ao crédito tributário não é um tema reservado à lei complementar.
O relator ainda explicou que, conforme a jurisprudência do STF, submeter o contribuinte a um regime fiscal diferenciado devido ao “inadimplemento reiterado” não configura “sanção política” quando não inviabiliza o exercício da atividade empresarial.
Por fim, o magistrado não constatou na lei gaúcha “hipóteses de cobrança de tributos por meios indiretos e coercitivos”, como interdição de estabelecimentos, apreensão de mercadorias ou proibição do exercício da atividade.
Repercussão positiva
O Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes (Sindicom), parte interessada na ação, comemorou a decisão. “O não pagamento reiterado do ICMS configura uma opção empresarial sistemática, visando obter vantagem competitiva desleal”, afirmou a entidade, em nota. “Diante deste cenário, a aplicação de tratamento diferenciado por parte do Estado é medida proporcional e razoável.”
“Empresas que sonegam deliberadamente o tributo prejudicam aquelas que cumprem suas obrigações regularmente e violam a isonomia e a justiça fiscal, já que os tributos constituem expressiva fonte de arrecadação de recursos públicos, os quais são aplicados em prol de toda a sociedade”, completou.
O Instituto Combustível Legal (ICL) também elogiou a decisão, mas avalia que ela precisa ser acompanhada de medidas nacionais. “A decisão do STF é um passo decisivo para dar mais poder aos estados contra os devedores contumazes. No entanto, é fundamental que o Congresso avance na aprovação de uma legislação federal que consolide esse entendimento e padronize os mecanismos de combate à inadimplência em todo o país”, afirmou o presidente da entidade, Emerson Kapaz.
ADI 4.854
CONJUR - JOSÉ HIGÍDIO
DIREITO TRIBUTÁRIO - KRAS BORGES E DUARTE ADVOGADOS - KRAS BORGES & DUARTE ADVOGADOS